domingo, 23 de abril de 2023

Medidas Protetivas Cristãs contra Heresias

A política da Igreja para com os Judeus


O primeiro concílio que se ocupa dos judeus é o de Elvira (305 ou 306) antiga cidade da Andaluzia, há muitos séculos destruída. Proíbe aos Cristãos darem aos judeus as suas filhas em casamento (cânone XVI) e comerem com eles (cânone L). Estas proibições repetem-se muitas vezes no decorrer dos tempos, o que indica a sua pouca observância. A proibição de contraírem casamentos judeus e Cristãos encontra-se no concílio de Calcedónia, em 451; nos sínodos de Orleães celebrados em 533, 538 e 481; e ainda no III Sínodo de Toledo, em 589; e no IV, celebrado entre os anos 630 e 680.

A proibição de comerem em sua companhia é repetida no sínodo de Agda (Agatha), em 506; no de Epaon, na Borgonha, em 517; no III sínodo de Orleães, em 538; e no I de Mâcon, em 581.

Ninguém deve constranger os judeus a abjurarem a sua fé e a abraçarem as crenças Cristãs. Esta disposição foi tomada no IV Concílio Nacional de Toledo, reunido em 633, sob a presidência de Sto. Isidoro de Sevilha e com a assistência de setenta e dois bispos vindos da Hispânia e da Gália Narbonesa.

«De futuro – diz o capítulo LVII deste concílio – nenhum judeu deve ser forçado a abraçar o Cristianismo; aqueles que o foram no reinado de Sisebuto, e que receberam os sacramentos, devem ficar Cristãos».

É para louvar esta medida que, infelizmente, um zelo mal compreendido, mais de uma vez veio contrariar. Mas se era justo, se era harmónico com o espírito de doçura do Cristianismo, que se não empregasse a violência como sistema de catequese, justo era também que os judeus se limitassem a seguir as suas crenças sem contrariarem as de quem quer que fosse. Não sucedeu porém assim.

O IV sínodo de Orleães, já por nós citado, pune com a perda de todos os seus escravos o judeu que chamar alguém às suas crenças; o de Mâcon diz: «se um judeu fizer apostatar um dos seus escravos Cristãos, perderá este escravo...»

Os Padres reunidos neste mesmo sínodo procuraram subtrair aos judeus os escravos Cristãos, decerto porque, como era natural, estes estavam mais arriscados a apostatar que os de fora. Nenhum judeu poderia ter, de futuro, escravos Cristãos; quanto aos existentes, podiam ser libertados mediante 12 soldos. Recusando receber esta soma, o escravo Cristão poderia sair, indo para casa de qualquer Cristão. Mais tarde, em 633, o IV concílio de Toledo declara expressamente: «os escravos dos judeus serão de hoje para o futuro livres» (cânone 66).

As intenções dos Padres reunidos nestas assembleias gerais, em diferentes épocas, claramente se refletem nas disposições que nos deixaram.

Queriam impedir a supremacia dos Judeus sobre os Cristãos. Cedo, como se vê da História, aqueles se tinham revelado ardentes propugnadores das suas crenças. Infiltrando-se insensivelmente nas sociedades cristãs, tomavam posse de lugares preponderantes, donde com facilidade vexavam os Cristãos. Por isso, os Padres dos concílios desejam afastá-los do convívio das populações cristãs; medidas extremas, como: obrigá-los a viverem em bairros separados e a trazerem sinais que a todos os dessem a conhecer, foram provocadas pelo desprezo de outras de grande brandura, que não surtiram efeito algum. Proibiu-se-lhes o terem escravos Cristãos e até o ocuparem no seu serviço operários que não seguissem as suas crenças. Não podiam desempenhar funções públicas, nem exercer a medicina entre os Cristãos. Todas estas, e muitas outras medidas de simples defesa, parecem não ter produzido o resultado ambicionado. Desse desprezo resultou o ser necessário adoptar outras de maior rigor.

O IV Concílio de Laterão, duodécimo ecuménico (1215), depois de ter proibido, no cânone 67, que os judeus exigissem interesses exagerados sob pena de serem privados de todas as relações com os Cristãos, impõe-lhes a obrigação de se distinguirem, pela maneira de vestir, dos Cristãos, com os quais convivem.

Desde então é que os judeus passaram a usar de um pedaço de pano amarelo ou vermelho, ou metade branco, metade vermelho, em forma de estrela, outras vezes redonda, quadrada, etc., que deviam colocar no peito, ou em lugar bem visível. Em Avinhão a rodela é substituída por um barrete amarelo, em Praga por uma manga da mesma côr, na Itália e na Alemanha por um capuz, chapéu vermelho ou verde e um penteado em forma de corno.

A observância desta lei custou sempre muito aos judeus, que procuraram por todos os estratagemas iludi-la ou desprezá-la. Muitos escondiam esse sinal debaixo das dobras da roupa; muitos usavam-no, mas tão pequeno que mal se distinguia; muitos outros transformavam-no de modo a parecer antes requinte de luxo e de ornato do que marca infamante. Não cessaram os concílios de lembrar o espírito com que tal medida fora tomada. Passados poucos anos depois de celebrado, o concílio de Laterão, em 1226, de novo se ordena que «a fim dos judeus se diferençarem dos Cristãos, trarão em cima dos vestidos, nas costas ou no peito, um sinal em forma de cruz».

O mesmo dispõe o sínodo de Rouen, em 1231; o de Tarragona, em 1233; outro desta mesma cidade, em 1239; o de Béziers, em 1246; o de Breslau, confirmado por Urbano IV, em 1263; o de Albi, em 1254; o de Montpellier, em 1258; enfim, o de Viena, em 1267.

Além desta instituição, tão penosa para os sectários do Judaísmo, estabeleceu-se outra que não pouco concorreu para o isolamento dos judeus: foi o que em Itália se chamou o Ghetto; na Provença e no condado Venaissin Carriêre; na Alemanha Judenviertel; entre nós – Judiaria.

Eram bairros limitados por altos muros, (...). As portas, que davam ingresso para a Judiaria, eram guardadas por oficiais pagos pelos judeus; fechavam-se à tarde, ao pôr-do-sol, e não se abriam senão pela manhã.

Foram os judeus que, por um princípio instintivo de defesa, primeiro se organizaram e reuniram. Os concílios adoptaram a ideia e regularizaram o uso, tornando-o obrigatório.

A 13 de Setembro de 1276, um delegado do Papa Gregório X presidia em Burges a um sínodo que num dos seus dezesseis capitula ordenava: que «os judeus não deviam habitar senão nas cidades e nas populações numerosas, para não poderem enganar as pessoas simples do campo e arrastá-las a partilhar dos seus erros». Esta prescrição foi repetida por outro sínodo, reunido em Ravenna, em 1211; e em outro, reunido em Salamanca, em 1335, encontramos esta singular disposição: «um Judeu, ou um Sarraceno, não deve habitar uma casa junta a uma igreja ou a um cemitério».

A 4 de Outubro de 1388 outro sínodo realizado em Palância, Castela, declara positivamente: «nas cidades que habitam, os judeus devem ter bairros à parte».

Estas disposições foram renovadas muitas vezes e sempre com o intuito de obviar ao proselitismo judaico; parecem-nos cruéis à luz da tolerância moderna, mas na Idade Média não tinham o carácter infamante que à primeira vista se nos afigura. Os concílios de Albi (1254), Montpellier (1258), Burges (1276), Pont-Audemer (1279), Offen (Hungria, 1279), Anse (junto a Lião, 1300), Trèves (1310), Bolonha (1330), Valladolid (1322), Avinhão (1337 e 1347), Praga (1349), Apt (1365), Lavaur (1368), Palância (1388), Salzburgo (1418), Bamberga (1451), e muitos outros, poucas disposições novas tomaram. Nos tempos modernos a reunião destas grandes assembleias do clero rareou muito. Novos problemas mais momentosos surgiram chamando a atenção da Igreja. Todavia já no nosso século a questão judaica se debateu em assembleias do clero, mais ou menos numerosas, mais ou menos importantes. Assim, as de Presburgo em 1822, de Strigonia em 1858, de Veneza em 1859, de Praga em 1860, de Utrecht, em 1865, tomam algumas medidas preventivas, a fim de não se estreitarem muito as relações entre Cristãos e judeus.

Joaquim Mendes dos Remédios in «Os Judeus em Portugal», 1895.

Fonte: https://accao-integral.blogspot.com/2021/05/a-politica-da-igreja-para-com-os-judeus.html

Abraços

Um comentário:

  1. "Defeza de Portugal: seminario periodico, politico e moral", Volume 1, Impr. Regia, 1833.
    Por Father Alvito Buela Pereira de Miranda

    https://books.google.pt/books?id=hSMrAQAAMAAJ&printsec=frontcover&hl=pt-PT&source=gbs_ge_summary_r

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